O padre Luís Almeida, pároco de Santo Condestável e da paróquia de Nossa Senhora Auxiliadora, coordenador de pastoral dos Salesianos de Lisboa, e responsável pela Cerimónia de Acolhimento ao Papa Francisco na Jornada Mundial da Juventude de 2023, é o convidado de mais um JMJ comBosco.
Para o convidado de Mariana Lagoas e Henrique Laureano, a Jornada Mundial da Juventude de 1991, em Czestochowa, na Polónia, foi o “despertar do mundo para muitas coisas”, para além do regresso do Papa João Paulo II a “sua casa”. O sacerdote considerou ainda que esta Jornada foi “uma grande manifestação de união e da certeza de que a fé é aglutinadora” e “gera união”.
Henrique – No episódio de hoje, temos um convidado especial.
Mariana – É natural do Porto, é padre Salesiano, pároco de Santo Condestável e de Nossa Senhora dos Prazeres, é coordenador da Pastoral dos Salesianos de Lisboa e está responsável pela cerimónia de acolhimento ao Santo Padre na JMJ de Lisboa, em 2023.
Henrique – Temos connosco, o Padre Luís Almeida.
Pe. Luís – Boa tarde, muito obrigado pelo convite e pela possibilidade de estar aqui convosco.
Henrique – Obrigado, senhor Padre, pela sua presença. Passamos à primeira pergunta.
Mariana – O que fazia na altura da Jornada Mundial da Juventude de 1991?
Pe. Luís – Na realidade, não faço a mínima ideia porque tinha cinco anos. Estaria, provavelmente, pelo Porto, ainda sem grande consciência do que se passava a nível da Igreja e sobretudo ligada à Jornada Mundial da Juventude.
Agora, à distância, consigo perceber claramente a grande importância que essa Jornada teve e a grandeza do evento que foi.
Henrique – Na sua opinião, esta jornada marcou o início de um mundo novo?
Pe. Luís – Talvez não o início de um mundo novo, mas o despertar do mundo para muitas coisas.
A Jornada Mundial da Juventude de 1991 é a primeira Jornada depois do fim da divisão da Europa e do fim da União Soviética e é, também, a primeira com a participação dos jovens do Leste da Europa e por isso, é profundamente marcada por esta realidade.
É, também, o regresso do Papa João Paulo II a casa, depois de tudo o que contribuiu para o fim desta divisão, através do seu pontificado e do seu próprio testemunho. Acaba por ser muito importante e muito significativo esta Jornada Mundial da Juventude, em Czestochowa, exatamente neste contexto que a Europa está a viver naquele tempo.
Por isso, mais do que o início do mundo novo é, com certeza, o abrir os olhos também para uma realidade juvenil daquele lado da cortina que existia na altura. É poder dar-se conta do quanto a juventude, apesar de tão limitada na vivência da sua fé, soube acolher essa transmissão da fé e soube, depois, manifestá-la e vivê-la de uma forma tão bonita como vemos depois, na vivência da própria Jornada Mundial da Juventude.
Mariana – O que é que nos leva, pessoalmente, a sentirmo-nos filhos de Deus, tal como o Papa João Paulo II afirmava na homilia?
Pe. Luís – O que nos leva a sentirmo-nos filhos de Deus é, sem dúvida, esta capacidade de nos deixarmos amar por Ele.
O Papa salienta muito isto, que verdadeiramente somos chamados a sentirmo-nos amados, e é isto que, a partir daí, também nos faz viver esta esta grandeza da filiação divina, que depois se faz, também, testemunho de fé.
Henrique – Neste ano de 1991, o que é que podiam esperar os jovens desta Jornada Mundial da Juventude?
Pe. Luís – Penso que podiam esperar uma grande manifestação de união, depois de um período em que não vivíamos tão unidos quanto gostaríamos. Podiam, também, esperar uma manifestação grande, de como a Igreja, verdadeiramente, está presente em todas as partes da Terra e como se manifesta como uma Igreja una, que está ao lado de todos os povos, e presente no coração de todos os jovens.
Penso que isto é uma realidade que naquela altura foi também muito bonita, muito importante e muito significativa para os jovens que viveram aquela Jornada.
Mariana – Pegando nessa vivência dos jovens que estavam nessa jornada que legado é que acha que ficou desta Jornada em Czestochowa?
Pe. Luís – Do meu ponto de vista, olhando também para a história da Igreja naquela terra, ficou sobretudo, para o povo polaco, um grande reconhecimento nos confrontos de um Papa que é seu e que nunca esqueceu a sua terra e, por isso também, uma grande presença e um grande sentido, unidos à Igreja Universal de quem eles foram sempre tão devotos e tão próximos, apesar das dificuldades que viveram.
Como legado, ficou a certeza de que não só a fé pode ser vivida em todos os contextos, mas como verdadeiramente a fé é aglutinadora, gera união e gera, ainda, verdadeira proximidade entre todos indo muito para além das barreiras que humanamente lhe podemos impor.
Fica o legado exatamente da perseverança desta juventude polaca, de como foram capazes de enfrentar tudo aquilo que enfrentaram e, também, a alegria que demonstraram e que se vê em acolher todos aqueles que quiseram estar ali presentes. Penso que isto é um legado que, para os jovens, é muito bonito. Um legado de perseverança, de alegria, que verdadeiramente depois acabam por continuar a ser cultivados em cada Jornada, em cada manifestação juvenil e do coração jovem da Igreja.
Henrique – Padre Luís, pergunto lhe se o perfil dos jovens de hoje é o mesmo daqueles que participaram em 1991 nas Jornadas de Czestochowa?
Pe. Luís – O perfil dos jovens de hoje não é semelhante aos jovens do ano passado ou de há pouco tempo, por isso, não existe um perfil de juventude, existem realidades juvenis variadas.
Os jovens de hoje, são completamente diferentes dos de 1991, com vivências, experiências e, sobretudo, com vivências de fé também completamente diferentes, ligadas a realidades completamente diferentes.
O que de semelhante se mantém, é o facto de os jovens serem profundamente marcados por uma ânsia de salvação, de conhecer Deus, de ver Deus presente em muitas realidades e, sobretudo, de O reconhecer, apesar de às vezes não se darem conta.
As diferenças são muitas, tirando que temos uma realidade juvenil muito mais cheia de informação que não naquele tempo, uma realidade juvenil muito mais marcada por experiências de fé ligadas ao serviço, à realidade de proximidade para com os outros e não tanto a uma realidade devocional, como a daquela época.
Temos um perfil de jovem diferente, porque, apesar de estarem constantemente em busca, são jovens muito mais abertos à sua própria realidade. São jovens que estão concentrados no outro e que encontram, nestes momentos de encontro e de vivência de fé, a possibilidade de expressar isto mesmo. Por isso, são jovens, profundamente diferentes, apesar de unidos pela semelhança que há desde sempre, que é este desejo e esta ânsia da busca de Deus.
Mariana – O Papa João Paulo II, na sua homilia, referia o recurso às drogas como algo que indicava que os jovens tinham perdido as razões pelas quais viver. Na sua opinião, isto é verdade? Considera que, atualmente, continuamos a encontrar esta postura? Se sim, que drogas é que podem ser estas que nos levam a perder as razões de viver?
Pe. Luís – Provavelmente as drogas não são as mesmas porque a realidade não é a mesma. Em 1991, estamos num período em que somos marcados por essa realidade mais premente da droga entre os jovens. Hoje, esta busca de razões de viver e de sentido de vida, é a mesma, ou seja, vemos na juventude, que ainda há muito esta ânsia de procurar razões para viver, de procurar o sentido da vida em sítios errados e de formas profundamente erradas e deturpadas.
Nós dizemos, com muita certeza, que essas razões de viver, as conseguimos encontrar na fé e em Deus, mas, atualmente, são muitas as coisas que podem alienar o jovem destas razões para viver. Se calhar não tanto as drogas propriamente ditas, dependendo das realidades e dos contextos onde estão inseridos, mas talvez, as drogas sejam muito mais uma autorreferencialidade, de uma busca de felicidade somente para si. São, se calhar, as drogas de uma sociedade que desvia os jovens do centro que é a entrega de si mesmo à busca da sua felicidade, procurando fazer outros felizes, ou até, da busca deste prazer em si mesmo, sem procurar um verdadeiro sentido para as coisas que faz.
Isto existe e acontece, mas a verdade é que, sobretudo como salesianos, temos esta capacidade de olhar para as realidades juvenis com muito otimismo e com muita alegria, ao ver o renascer dos jovens neste sentido de Deus, desta alegria de ser Igreja, do ser e do sentir verdadeiramente o chamamento e convocação de Cristo, para serem bons e fazer coisas boas pelos outros.
Hoje, conseguimos notar claramente sinais de um renascer na fé que é muito claro e, na Igreja portuguesa, temos lutado por isto. Portanto, vemos os jovens sim, com dificuldade, a encontrar razões para viver, mas numa busca muito sincera dessas razões e acho que isto tem sido muito bonito de reconhecer.
Henrique – Nesta Jornada, o Papa João Paulo II disse que os jovens são mensageiros da Boa Nova da Salvação. Pergunto se os jovens de hoje estão preparados para serem estes mesmos mensageiros?
Pe. Luís – Preparados a cem por cento, nem os jovens, nem os adultos. Ser mensageiros da Boa Nova, é mesmo deixar-se habitar por Deus, mas, os jovens de hoje, e falo sempre desta realidade que vamos acompanhando, são verdadeiramente claras testemunhas da presença de Deus no mundo e na sua vida. Penso que são, cada vez mais, preparados para isto e vivem-no de forma muito clara, no empenho claro de viver a própria fé e de anunciar, também, aos outros e isto é algo que nos deve deixar profundamente contentes.
Se lermos todas as homilias dos Papas, em todas as Jornadas Mundiais da Juventude, este apelo a que os jovens sejam verdadeiramente missionários da Boa Nova, que sejam verdadeiramente presença e anúncio de Cristo no mundo, está sempre presente e vai estar presente até ao fim dos tempos, porque é esta a missão da Igreja em si e de todos aqueles que estão na Igreja.
Cada vez mais nos damos conta que, para anunciar o Evangelho aos jovens e àqueles que devem verdadeiramente ser, também a força viva da Igreja, ninguém melhor do que os próprios jovens missionários, que verdadeiramente vivem e anunciam a própria fé. A preparação da Jornada Mundial da Juventude de 2023, também tem sido muito clara nestes jovens que testemunham e anunciam a sua fé, com muita vontade e rigor, e isto é um sinal mesmo muito bonito de como a Jornada Mundial da Juventude tem ajudado os jovens a fazer caminho nesta dimensão de testemunho da própria fé.
Mariana – Por último, Padre Luís, de forma breve, que mensagem gostaria de deixar aos jovens que se estão a preparar para esta Jornada Mundial da Juventude, em Lisboa, em 2023?
Pe. Luís – Que verdadeiramente vivam com alegria este tempo de Igreja que vai ser a Jornada Mundial da Juventude. Penso que, se cada jovem se sentir verdadeiramente feliz por participar na Jornada Mundial da Juventude, por se encontrar com Jesus Cristo através do seu encontro com o Papa, através do seu encontro com os milhares de jovens que virão até Lisboa, esta alegria é de tal forma preciosa que acaba por ser contagiante, por invadir a própria vida e através disso chegar aos outros.
O meu grande desejo é que, verdadeiramente, isto seja uma oportunidade de mostrar como Jesus Cristo traz felicidade e de como a Igreja é, sobretudo, uma anunciadora de alegria que nasce desta certeza de que Cristo também caminha connosco. Por isso, a cada jovem, o desafio é mesmo que se sintam verdadeiramente felizes por participar nesta Jornada Mundial da Juventude e que mostrem essa felicidade, ajudando a prepará-la, rezando e vivendo em pleno essa felicidade que só Cristo pode dar.
Henrique – Muito obrigado, Padre Luís, pela sua presença e pelas suas palavras.
