Henrique – Olá a todos! Connosco temos hoje uma convidada muito especial. Chama-se Zita Siopa, é natural de Cascais, é antiga aluna das Filhas de Maria Auxiliadora e pertence atualmente à paróquia de Alcabideche. Muito bem-vinda.
Zita – Obrigada.
Mariana – Começo por lhe perguntar o que a levou a participar na primeira Jornada Mundial da Juventude de 1987, que teve lugar em Buenos Aires.
Zita – O que me levou a participar nesta Jornada, foi um convite que me foi dirigido, pela Provincial da altura, a Irmã Maria de Jesus, para eu integrar um grupo de antigas alunas italianas, que iam a este encontro.
Portanto, eu fui sozinha de Portugal, juntei-me a este grupo de antigas alunas italianas que estavam em Roma, e de lá partimos para Buenos Aires.
Henrique – O que é que representou, para si, esta participação?
Zita – Um misto de sentimentos, porque participar numa jornada é um misto de vivências e de experiências, que para mim, eram completamente novas.
Eu tinha 20 anos, saía de Portugal sozinha e ia-me juntar a um grupo que eu não conhecia, que falava uma língua que eu não dominava e tudo isso era um misto de medo e de expectativa, mas ao mesmo tempo de uma certa excitação, um certo deslumbramento. Na altura, também não houve nenhuma preparação para a jornada, portanto, eu ia mesmo sem qualquer preparação ou enquadramento. Sabia que era um encontro com o Papa e isso bastava, mas trazia-me muita incógnita e o desconhecido era enorme.
Depois, veio o sentimento de encontro e de participação, que é sempre exigente, porque estamos ali muitos dias, deslocamo-nos do nosso país, saímos do nosso conforto, andamos de mochila às costas, dormimos fora da nossa cama. No entanto, depois, o conhecimento e o envolvimento com o grupo e com as pessoas foi muito compensador e correu muito bem.
Mariana – Sendo a Jornada Mundial da Juventude uma experiência marcante, disse-nos que sabia que era um encontro com o Papa, mas pouco mais. Fazia ideia da quantidade de jovens com que iria estar, por exemplo?
Zita – Fazia ideia de que eram muitos jovens, mas não tinha a dimensão do que era um encontro internacional, que já naquela altura reuniu cerca de 1 milhão de jovens.
Nos dias antes, nós vamo-nos preparando com catequeses, encontros, mas tudo em menor quantidade de pessoas e com grupos mais ou menos organizados. Portanto, aquela dimensão de perceber que estavam ali 1 milhão de jovens, de diversas culturas, foi o maior impacto do momento. Ter consciência que fazemos parte deste grupo e que em todo o mundo há pessoas como nós, que vivem esta experiência e acreditam nesse Cristo, naquilo que nós acreditamos, é deslumbrante.
Henrique – Zita, como foi participar neste encontro que há 30 anos atrás era assim algo muito audacioso?
Zita – Para além do que já vos disse, acredito que todas as jornadas deixem um rasto em quem lá vai. Não é o cansaço, nem a excitação, nem a dimensão que nos marcam enquanto pessoas, isso é o seu impacto mais ou menos imediato. O que fica depois, é aquilo que nós conseguimos trazer, e que conseguimos transformar na nossa vida.
O que a jornada mais me deu foi confiança, foi esta perceção e esta consciencialização de que de facto nós não estamos sozinhos, que há toda uma multidão, no mundo inteiro, que grita, como nós, esta esperança de Cristo ressuscitado, e que isto é muito maior do que nós.
Mariana – Referiu que era marcante, o facto de haver tantos jovens ao redor de todo o mundo que sentiam este amor por Deus, e que mostravam isso especialmente nas jornadas, onde nos encontrávamos todos. Pergunto-lhe se existe algum momento que recorda com mais carinho desta Jornada.
Zita – Para mim, o momento mais marcante, foi ter recebido a cruz da Europa das mãos do Papa, porque foi inesperado e simplesmente espetacular.
Eu já estava no grupo italiano, éramos cerca de 20 e tal e em determinado momento, percebi que aquele grupo estava responsável por receber a cruz da Europa. Vendo agora à distância, acho que a Irmã que era responsável do grupo deve ter ficado com dor enorme de cabeça, porque não sabia quem queria mandar, então, teve um critério que foi mandar a única portuguesa.
Na sexta-feira à noite, quando estávamos a preparar-nos, ela disse-me que no domingo, ia receber a cruz da Europa e eu fui. Foi o mais extraordinário, porque de repente, não só participava na Jornada do outro lado do mundo, como recebia a cruz das mãos do Papa. Foi espetacular.
Henrique – Então, qual é a sensação de ser a única portuguesa a ir a esta jornada e, além disso, poder receber esta cruz das mãos do Papa? Qual é que foi a sensação que teve na altura?
Zita – Senti uma grande gratidão, mas acho que essa gratidão, com a consciencialização do que aconteceu, foi sempre crescendo. Hoje, eu tenho uma enorme gratidão, àquela irmã que me disse “és tu” sabe Deus porquê, às irmãs de um modo geral que me proporcionaram ir à Argentina, e depois, uma enorme gratidão por aquilo que são as jornadas, porque acho que, o Papa João Paulo II teve uma visão e uma capacidade de ver e perceber que juntando os jovens fazia a diferença.
Portugal não aderiu, é verdade, mas o mundo inteiro aderiu e, portanto, é uma enorme gratidão e um bem tão grande que extravasa aquilo que nós somos, que é muito maior do que nós.
Mariana – Apesar de Portugal não ter aderido a esta primeira Jornada, depois voltou a participar em mais alguma?
Zita – Participei logo no ano a seguir, em 1989, em Santiago de Compostela, mas aí foi diferente, porque já houve organização, já o Patriarcado de Lisboa se organizou, a Igreja portuguesa já se organizou. Nós fomos com o Patriarcado Lisboa, já organizados, já com um grupo de jovens onde eu estava inserida, tudo muito diferente, nada a ver.
Henrique – E como é que se vê a participar nas Jornada Mundial da Juventude de Lisboa? Como é que vê que pode ser uma mais-valia para estes jovens que vêm viver esta Jornada?
Zita – Penso que a mais-valia é sempre a mesma, é o encontro e a consciencialização. Depois, a Jornada vai tocar especialmente, cada jovem que lá vai estar, uns por um motivo, outros por outro, mas eu acredito que toca a todos de formas lindas.
É maravilhoso pensarmos que Portugal teve a oportunidade de organizar a Jornada e ter este papel de receber, de ser acolhedor destes milhares de jovens. É uma oportunidade maravilhosa, mas também é uma enorme responsabilidade que eu espero que corra muito bem.
Vai correr porque nós somos bons a receber, mas eu acho que é uma enorme responsabilidade para a Igreja Portuguesa e para nós todos que nos identificamos com a Igreja.
Henrique – Neste sentido, que mensagem gostaria de deixar aos jovens que estão agora a preparar-se para viver a Jornada Mundial da Juventude de Lisboa 2023?
Zita – Penso que a melhor preparação é manter acesa esta vontade de participar e acho que nisso, a Igreja e os grupos organizados têm um papel determinante que é conseguir, nesse tempo que cada vez é mais longo, manter nos jovens este interesse e esta vontade de participar, depois o resto vai acontecer em cada um, à medida de cada um, com o caminho que cada um fizer.
Mariana – Ficando com este desafio de manter e dinamizar os jovens a participar nas jornadas, agradecemos-lhe muito as suas palavras e o seu testemunho e esperamos que os jovens consigam viver esta Jornada tal como conseguiu viver a sua primeira. Muito obrigada!